Contos

Querido diário,
Não sei por onde começar. Tudo o que sei é que preciso desabafar de alguma forma e essa foi a única que encontrei: você. Não posso me atrever a contar o que passo neste momento a mais ninguém, pois sei que sempre há fofoqueiros à espreita, a espera, que, eu cometa algum erro e cause algum escândalo em minha família.
Jamais poderei ser tão descuidada a ponto de permitir que meus pensamentos mais profundos e secretos venham à tona, seria vergonhoso e embaraçoso. Nunca em minha vida senti-me tão vulnerável, afinal de contas, não me vejo dessa forma como minha família acredita que eu seja.
Porém, agora me encontro assim e não sei o que fazer nem pensar. Sem mais delongas, sinto dizer que estou profundamente apaixonada. Sei que parece normal uma jovem como eu se apaixonar, “Já não era hora” diriam alguns, mas não é normal. Não é normal, pois, me apaixonei pela pessoa mais perigosa que alguém poderia se apaixonar.
Lamento profundamente, principalmente no que concerne a minha futura sanidade mental, dizer que, estou apaixonada por um esteta. Foi algo a primeira vista que fui incapaz de controlar e que, muito provavelmente, eu não iria querer controlar mesmo que eu pudesse.
Um recém chegado, não tão qualquer assim, na cidade. Recém chegado esse que me conquistou pela primeira vez em que seus olhos cruzaram o meu caminho. Seus lábios escondiam um sorriso presunçoso enquanto seus olhos fitavam-me como se ele pudesse ver minha alma. Seus cabelos eram de um negro intenso o que contrastava com sua pele pálida e seus olhos que me lembrava das esmeraldas que minha mãe usava em seu pescoço.
Ao passar por mim sorriu mais abertamente, um sorriso torto que dizia claramente que ele sabia que eu estava encantada por ele. Seus olhos, semicerrados de forma sexy e sugestiva, piscaram para mim antes do meu pai chegar ao meu lado fazendo com que, ele se retirasse de vista.
Obviamente, só mais tarde descobri pela minha família a preocupante reputação do sujeito. Um artista muito talentoso, segundo minha família, mas igualmente inapropriado para uma mulher como eu.
- Meu sogro estava me contando que ele faz muito sucesso na capital. – disse meu pai à minha mãe que parecia entredidamente curiosa.
- O que ele faz? – perguntei sem conseguir esconder minha ansiedade. Minha mãe me lançou um olhar desconfiado, mas felizmente meu pai nada percebeu.
- É pintor. Um dos melhores! – meu pai parecia animado. – Eu queria mesmo uma imagem recente sua. Estou pensando em contratá-lo... O que acha?
- Eu... – hesitei ao responder. Será que seria prudente de minha parte concordar? “Não!” minha mente berrou, mas minha boca tomou vida e respondeu as seguintes palavras antes que eu fosse capaz de fechar a minha boca. – Sim, eu adoraria.
- Ótimo, ele virá hoje mesmo, hoje à tarde. Está tudo combinado. – meu pai parecia genuinamente feliz.
- E se eu dissesse não? – perguntei.
- Eu mandaria cancelar, é claro.
Naquele mesmo dia conheci então o sujeito que mudaria minha vida de forma drástica e permanente. Naquele dia, descobri que me sentia atraída por ele de forma muito mais intensa do que já tinha experimentado na vida. Naquele dia, me atrevo a dizer que redescobri o significado da palavra atração.
Tudo nele me seduzia.
Ele era diferente de tudo aquilo que eu havia lidado. Ele era diferente de todos os garotos que eu já havia conhecido e me relacionado. Ele era diferente. Ele era, para mim, a personificação da perdição, da minha perdição.
Conforme conversávamos e nos conhecíamos durante horas e horas dos dias em que ele pintava meu quadro, descobri coisas sobre ele que eu não sabia se me deixava mais encantada ou aterrorizada, um pouco dos dois, creio eu.
Ou muito dos dois, melhor dizendo.
Certa vez perguntei a ele para me falar mais sobre ele e ele apenas sorriu e disse uma palavrinha que dizia muito dizendo pouco.
- Sou esteta. – disse em sua voz gutural.
No momento apenas franzi o cenho ao ouvir tal palavra desconhecida. Ele apenas sorriu ao, provavelmente, perceber minha ignorância ao ouvir sua definição de si mesmo. Decidi que minha melhor opção era perguntar ao meu pai.
- Esteta? Onde você ouviu isso? – meu pai perguntou desconfiado. Eu apenas dei de ombros e o deixei falar. – Bom, é o tipo de homem que eu jamais gostaria ou permitiria você se envolver. São movidos a realizar seus desejos numa espécie de busca de prazer que nunca chega. Gostam de seduzir mulheres como você, portanto fique longe de um quando souber que é um. Você simplesmente cairia na lábia desse filho da puta e depois ele te abandonaria. É tudo o que você precisa saber. – o tom utilizado pelo meu pai era claramente encerrando o assunto, não ousei falar mais nada.
Eu sabia que meu pai estava fazendo uma leitura provavelmente muito equivocada sobre o real significado, mas pelo o que meu pai dissera, eu só tinha uma certeza: eu estava lascada.

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